quinta-feira, 1 de julho de 2010

Os ímpares


Um dia eu estava levando uma amiga para casa e ela me pediu para mudar o volume do som:

- Vou colocar no 10 rapidinho viu?

Eu, que pensava que o som estava alto demais concordei e fiz um comentário de como não gosto de ouvir música muito alta. Ela disse:

- Não, não. É que os números ímpares não são legais. Acho melhor deixar no par.

Comecei a refletir sobre essa constatação. Por que será que as pessoas preferem os pares? Será um tic nervoso, tipo quase um TOC? Será uma questão de simetria? Ou simplesmente é o subconsciente que diz que para tudo tem que haver um correspondente?

Eu não. Eu sempre gostei dos ímpares. Quando tinha sete anos descobri o quanto gostava desse número. Tinha até o escolhido para ser o meu número da sorte. Pena que ele não me escolheu.

Para mim sempre houve um admirável ar de independência nos ímpares. Lembro-me de quando conheci os números primos na aula de matemática. Não lembro o dia ou série com precisão, mas lembro de como a palavra soou aos meus ouvidos. PRIMOS. Que denominação mais estranha para números! Por que seria? Haveria alguma analogia? Os primos são sempre ímpares e não se relacionam com ninguém a não ser consigo e com e o número 1. Quando descobri que o sete era primo então...

Os pares sempre me pareceram sem sal, previsíveis até. Predestinados a cumprir as funções de multiplicar e dividir os outros em partes iguais. Boa filosofia de vida essa, mas sem graça.

Desde então, tudo tinha que ser ímpar para mim a não ser as notas na escola. O que quero dizer é que usava inclusive a palavra ímpar e seus sinônimos como adjetivos em meus textos. Ímpar, singular, único.

Eu me achava pertencente ao grupo dos ímpares. Queria ser. Tinha orgulho. Mas com o passar do tempo (e no decorrer desse texto) percebi que os ímpares, os primos principalmente, estão designados à solidão. Só sabem se relacionar com poucos, enquanto os pares são versáteis e tem sempre mais do que duas possibilidades.

É muito bonito dizer "fui criado para ser de um só", mas é triste de viver. Descobri então a predestinação dos ímpares, a sua exclusividade e dependência de outrem. A inferioridade de existir só para completar a sequência de pares felizes.

Como enganam as primeiras impressões. Senti pena. Pena de mim mesma inclusive. Sofri. Desencantei.

Um comentário:

  1. Louise, quando tu me contaste o tema do texto, na mesma hora eu imaginei a trajetória que ia tomar, mas tenho que confessar que o final me surpreendeu. Eu esperava outro tipo de conclusão, mais otimista.
    Não acho que seja assim tão ruim e solitário ser ímpar. Tudo bem que os ímpares acabam sobrando muitas vezes... Mas sei lá, a matemática é perfeita (já que estamos falando de números) e tu deverias te lembrar que sempre que um número impar soma o seu "valor" a outro "valor ímpar", o resultado é sempre um par...

    O texto ficou muito bom, parabéns ;*
    Mariah

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